domingo, 3 de novembro de 2019

Sua mãe esperava que você fosse mulher ou homem durante a gestação?

Rótulos

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Uma das situações mais delicadas, sem dúvida, é a de se tratar de uma menina quando se esperava um menino – o caso mais comum – ou de um menino quando se esperava uma menina. A filha esperada como um filho tende amiúde a desempenhar o papel do menino que não veio. Embora não se possa generalizar, não nos esqueçamos disso, essa é a resposta mais corriqueira a esse problema. Essa filha desenvolve muito mais intensamente seu “homem interior” do que a sua “mulher interior”. Ela vive essa polaridade masculina em função do que os pais e sua arvore genealógica definem como imagem de virilidade, que projetam sobre essa criança a mãe, que talvez tenha por sua vez um “homem interior” desenvolvido, o pai e eventualmente os avós? Como agem os pais em função de sua própria história familiar? De forma geral, essa filha é bastante encorajada a desenvolver o intelecto ou, antes, a obter diplomas, pois se espera que ela exerça uma profissão que lhe permita ter um lugar na sociedade equivalente ao de um homem. Havia antigamente famílias em que só os meninos tinham o direito de estudar. As vezes, essa filha privilegia o esporte de um modo masculino, baseado no desenvolvimento da força. É frequente que use apenas roupas andróginas, detestando saias e vestidos.

Em contrapartida, um filho esperado como filha recebe da família, e muitas vezes da mãe, uma educação voltada para o desenvolvimento de sua “mulher interior”. Também nesse caso, é preciso saber como a arvore genealógica concebe a feminilidade. Alguns pacientes angustiam-se com essa herança psicológica porque mostram dificuldade de identificar e afirmar sua virilidade. Muitos homens confundem homossexualidade e “feminilidade interior” desenvolvida. Ora, grandes artistas, não necessariamente homossexuais, criam a partir dessa polaridade. Numerosas profissões, mesmo cientificas, necessitam de uma forte intuição, parte feminina do intelecto.

As dificuldades dessas filhas e filhos assumem maior amplitude na adolescência, período em que a sexualidade começa a desabrochar. Numerosas pacientes esperadas como filhos nunca ouviram do pai ou dos homens da família sequer uma palavra relativa ao seu físico de jovem. Muitos pacientes esperados como filhas jamais receberam da família estímulos a exprimir-se, a ousar empreender. O trabalho psicológico consiste em ajudar no desenvolvimento da potencialidade reprimida e em harmonizar no interior da pessoa masculinidade e feminilidade.

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Evidentemente, quando somos bem pequenos, de certa forma nós sofremos. Não compreendemos que, se temos dificuldades com nossa mãe e ela conosco, isso provém de sua própria história familiar. Uma vez adultos, se queremos de fato tornar-nos nós mesmos, desidentificar-nos de nossa programação psicogenealogica, nosso “trabalho” consiste em conscientizar-nos do que se produziu. O que nos fez sofrer na infância – e amiúde o faz até agora – nada tem que ver, na maioria dos casos, conosco.
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Texto extraído do livro Família que vive em nós - Chantal Rialland

Titulo original: Cette famille qui vit em nous – 1994.

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